SOCIEDADE LOW POWER

INTRODUÇÃO

A Giorgio Alberti
Em memória de Daniel Charles

 

Como melhorar o mundo: você só tornará as coisas piores.
John Cage

 

Na primavera de 2003 eu caminhava junto ao lago Maggiore, em Locarno, Suíça, com Giorgio Alberti - um amigo de muitos anos.

René Berger nos apresentou na década de 1980. Estávamos todos envolvidos no célebre Festival de Vídeo Arte e de Arte Electrónica de Locarno, dirigido por Rinaldo Bianda, René Berger e Lorenzo Bianda, por onde passaram nomes como Nan June Paik, Steina e Woody Vasulka, Bill Viola, Edgar Morin, Tim Berners-Lee, Pierre Levy, Francis Ford Coppola, Basarab Nicolescu, Joseph Brenner, Francesco Mariotti e muitos mais. Aqueles fantásticos festivais também incluíam conferências e debates sobre arte, ciência e filosofia.

Era um final de tarde com um brilhante céu azul profundo em 2003 e eu caminhava calmamente com Giorgio Alberti, um PhD em informática, MBA do INSEAD em Fontainebleau, antigo gestor de sucesso que se tornara coleccionador de arte contemporânea e um especialista em arte e alquimia.

Ele estava fascinado com estudos que mostravam a modernidade do pensamento de John Kenneth Galbraith, com quem estivera pessoalmente alguns anos antes. "Hoje, tudo é fácil para as crianças e adolescentes. Eles têm, quase automaticamente, computadores, telemóveis, leitores de cds e de dvds, uma quantidade praticamente ilimitada de programas, música ou filmes. Tudo rápido e automático. Quando essas crianças crescerem, o nosso mundo estará profundamente mudado. Não existe mais a antiga ideia de esforço pessoal para se alcançar alguma coisa. Tudo gira em torno do low price. Criamos uma sociedade low price!".

Ele estava certo. A partir daquele momento, nos cinco anos seguintes, fui desenvolvendo este projecto, que é dedicado a Giorgio Alberti.

Em 2006, estivemos juntos no Encontro Internacional de arte e ciência O Espírito da Descoberta, em Trancoso, uma pequena e maravilhosa cidade medieval, no norte de Portugal, onde eu tinha criado a Fundação para as Artes, Ciências e Tecnologias - Observatório. Naquele Encontro também participaram o filósofo e cientista Americano Joseph Brenner; o genial Roy Ascott, da Inglaterra, que é um dos mais importantes artistas e filósofos do cibermundo em todo o planeta; Alex Adriaansens, fundador do famoso núcleo de arte contemporânea V2 Organisation em Roterdão, Holanda; Gyorgy Darvas, cristalógrafo e historiador da ciência, da Hungria; o arquitecto Marcos Novak, criador do conceito de espaços líquidos; o arquitecto Português Gonçalo Furtado; a artista conceptual Americana Dove Bradshaw, o artista Suíço Peruano Francesco Mariotti; a artista Polonesa Monika Weiss e o escritor e artista Português António Cerveira Pinto.

Naquele Encontro Giorgio Alberti apresentou uma conferência chamada Amores-Eros & Low Power Society, que mais tarde seria publicada no Technoetic Arts quando fui o editor.

Numa das primeiras noites, quando estávamos numa grande mesa redonda ao jantar, começamos um brainstorm sobre as ideias de Giorgio Alberti e assim nasceu o conceito da Low Power Society.

No início do ano seguinte, Giorgio Alberti realizou um Encontro Internacional na Fundação Monte Verita, em Ascona, Locarno, na Suíça, que girou em torno das ideias que fundaram o conceito da Low Power Society - o Encontro se chamou Fim de uma crença, na direcção da era do subdesenvolvimento.

Em 2007, também na mesma cidade e uma vez mais durante o Encontro Internacional de arte ciência O Espírito da Descoberta, também organizado pela Fundação para as Artes, Ciências e Tecnologias - Observatório, continuamos a reflexão sobre o conceito, desta vez gerando grupos de trabalho e reflexão. Minha conferência, então, teve o título Low Power Society e foi a base deste livro.

Naquele ano, para além de Giorgio Alberti e eu, também estavam presentes, novamente Roy Ascott e Joseph Brenner - que também apresentou uma conferência, muito interessante, sobre o tema: Transdisciplinaridade, Lógica e a Sociedade Low Power; a filósofa Espanhola Carmen Pardo; o filósofo e neurologista Espanhol Pedro Marijuan; novamente o filósofo e escritor Português António Cerveira Pinto; o músico Italiano Leonello Tarabella; novamente a artista Americana Dove Bradshaw; o matemático Jay Kappraff do Instituto de Tecnologia de Nova Jérsei; a artista, também Americana, Rosemarie Castoro; e a grande violoncelista Inglesa Audrey Riley.

Nesses Encontros, René Berger esteve sempre presente, participando de Lausanne, na Suíça, através de meios electrónicos.

No ano seguinte, em 2008, Alberti organizou um novo Encontro Internacional dedicado especificamente ao tema, uma vez mais na Fundação Monte Verità, na Suíça.

Nesse mesmo ano, em 2008, em Nova York, a artista plástica Marcia Grostein ficou encantada com o conceito e surgiu a ideia de fazermos uma grande exposição revelando questões convencionalmente consideradas como exclusivamente económicas ou sociológicas como sendo, de facto, estéticas. René Berger já o fizera no World Economic Forum, em Davos, nos anos 1990, ainda que não especificamente sobre uma Low Power Society.

Nina Colosi, criadora do Streaming Museum em Nova York, rapidamente abraçou a ideia com entusiasmo. Logo, Paul Goldberg - que para além de expert em sistemas financeiros também é um reconhecido músico de jazz - tornou-se produtor de uma futura exposição de arte contemporânea sobre o tema.

Essa é uma breve história de como nasceu o conceito sobre uma Low Power Society. No final do livro há um timeline dos eventos que determinaram o conceito até agora.

Quando eu acabei o livro, recebi a triste notícia do desaparecimento de Daniel Charles - querido amigo, grande e generoso filósofo a quem tão profundamente sempre admirei. Mesmo que não tenha estado envolvido com o projecto original, decidi também dedicar este trabalho à sua memória. Giorgio Alberti é o verdadeiro pai do conceito.

O livro está dividido, sem fronteiras muitos definidas, em duas partes - uma primeira, mais orientada para questões filosóficas; e, a seguir, uma parte mais dedicada ao mundo concreto. Tudo flutuando num fluxo, sem capítulos ou departamentos.

Não se trata de um livro sobre o futuro, mas sobre o presente, que já é passado. Não se trata de fazer julgamentos de valor, se isto ou aquilo é certo ou errado - como reitero algumas vezes durante o texto.

Também, não é uma abordagem absoluta - e sim, uma porta para novas ideias, para novas abordagens.

Não se trata de pretender melhorar o mundo. Apenas um olhar arregalado - nos mundos visual e de texto - para a escala humana de um universo em permanente metamorfose.

 

Emanuel Dimas de Melo Pimenta
Nova York, 2008

 

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